O Poder Político tem demonstrado, com especial ênfase nos anos de poder e governação socialistas, possuir uma inesgotável propensão — totalizante ou mesmo totalitária — para querer regular praticamente todos os aspectos da nossa vida pessoal, familiar, profissional e social.
Muita da legislação tem subjacente opções políticas e ideológicas bem definidas e claramente assumidas. Outra há, no entanto, em que a ideologia que lhe está subjacente é estratégica e deliberadamente escondida, muitas vezes sob a capa da pretensa defesa de direitos e liberdades dos cidadãos, por forma a que a sua aprovação não cause alarme e alarde social e, assim, possa ocorrer de mansinho, como diz o povo, sem que a sociedade civil (e infelizmente até a política) dê por isso.
Um “bom” exemplo (pelas piores razões) dessa estratégia político-legislativa é, sem dúvida, a que está subjacente à legislação que os deputados querem aprovar destinada a promover o exercício dos denominados “direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa” estabelecidos na Lei nº 38/2018, de 07.08, em todos os níveis de ensino e ciclos de estudo, ministrados em todas as escolas, públicas e privadas, do País.
Com efeito, no passado dia 21 de Abril foram aprovados na generalidade, em sessão plenária da Assembleia da República, vários projectos de lei com o quadro para a emissão das medidas administrativas que as escolas devem adoptar para implementação da Lei nº 38/2018, a saber, o Projecto de Lei nº 21/XV/1ª (PAN), o Projecto de Lei nº 332/XV/1ª (PS) e o Projecto de Lei nº 359/XV/1ª (BE).
Nessa mesmo dia 21 de Abril, foram ainda aprovados vários projectos de lei que ao mesmo tempo que pretendem criminalizar ex-novo as denominadas “terapias de conversão sexual” as despenalizam se realizadas no contexto da autodeterminação de género, a saber, o Projecto de Lei nº 72/XV/1ª (BE), o Projecto de Lei nº 209/XV/1ª (L), o Projecto de Lei nº 699/XV/1ª (PAN) e o Projecto de Lei nº 707/XV/1ª (PS).
Todos estes diplomas baixaram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (a 1ª Comissão), para discussão e aprovação na especialidade, sendo por isso espectável que o respectivo processo legislativo prossiga os seus termos na presente sessão legislativa, sendo o seu desfecho antecipável se nada for feito para contrariar o mesmo.
Opresente artigo abordará apenas a matéria referente ao primeiro conjunto de diplomas referidos e terá por base o Texto de Substituição relativo ao Projecto de Lei nº 21/XV/1ª (PAN), ao Projecto de Lei nº 332/XV (PS) e ao Projecto de Lei nº 359/XV/1ª (BE), que foi, entretanto, apresentado na 1ª Comissão (refira-se que tanto a IL como o PCP apresentaram propostas de alteração).
E, em primeiro lugar, é preciso ter presente que aquilo que está em causa com esta legislação não é o respeito pelo exercício de direitos por parte de pessoas adultas com plena capacidade civil para tal exercício, mas sim a legalização da promoção junto das crianças e dos jovens de uma nefasta ideologia – a Ideologia de Género -, com todas as consequências altamente nocivas que a mesma acarreta para as crianças e jovens alvos experimentais da mesma, nomeadamente em termos físicos, emocionais, mentais (psicológicos ou psiquiátricos) e sociais.
Citando Pedro Vaz Pato, a Ideologia de Género “parte da distinção entre sexo e género, a qual se insere na distinção mais ampla entre natureza e cultura. O sexo representa a condição natural e biológica da diferença física entre homem e mulher. O género representa a construção histórico-cultural da identidade masculina e feminina. Até aqui, nada de novo, ou ideológico. A novidade reside na afirmação ideológica de que o género assim concebido deve sobrepor-se ao sexo assim concebido; a cultura deve sobrepor-se à natureza. O género não tem de corresponder ao sexo, corresponde a uma escolha subjetiva, que vai para além dos dados naturais e objetivos.” (cfr. «Uma Revolução Antropológica», 7Margens, 29.08.2019).
Para a Ideologia de Género, o sexo biológico não tem qualquer interferência ou relevância na formação da identidade de género de cada pessoa, sendo o género considerado uma pura construção social e cultural, desligado do sexo que se diz ser atribuído à nascença (e não determinado na fecundação), pelo que o género pode ser desconstruído e reconstruído.
Mas com uma ressalva importante (ainda que não expressamente assumida pelos ideólogos do género): essa desconstrução e reconstrução apenas têm um sentido único, uma vez que apenas podem ser feitas se for para afirmar um género que não seja conforme com o sexo da pessoa, já não sendo permitidas, ou vistas favoravelmente, a desconstrução e reconstrução do género (auto-atribuído e auto-construído) que se queira conformar com o sexo e as características sexuais da pessoa.
Antes, ainda, de analisar aquilo que os deputados (do PS, BE, PAN, Livre, PCP e IL) querem aprovar – a legalização da imposição e promoção da Ideologia de Género nas escolas –, importa recordar alguns dos antecedentes desta legislação, pois o seu conhecimento é fundamental para uma cabal compreensão daquilo que verdadeiramente se pretende com esta revolução antropológica que urge denunciar, desconstruir e combater.
Continua aqui https://observador.pt/opiniao/a-promocao-da-ideologia-de-genero-nas-escolas-e-o-abuso-de-menores/